Políticas públicas... daquele jeito

No dia 23 de setembro recebi um email disparado pela Fundart, Fundação de Arte e Cultura ligada à Prefeitura de Ubatuba. Era um convite para o "Fórum de Políticas Públicas". Fiquei duplamente surpreso: por só ter ouvido falar no evento três dias antes de ele acontecer; e pela quantidade de nomes ligados ao governo estadual na programação. Parecia programação de uma colônia de férias para autoridades do governo. De todo modo, identifiquei os temas que me interessavam (resíduos sólidos, turismo e cultura) e ainda lamentei o fato de que iria para São Paulo na quarta-feira e perderia a presença secretário do meio ambiente.

Já no primeiro dia, as coisas pareciam estranhas. Supostamente haveria a "abertura solene" às 18h45, e o tema que me interessava seria às 19h30. Cheguei pouco depois disso, e ainda assim peguei o hino nacional e o hino de Ubatuba, seguidos da abertura com o prefeito, ladeado por seu chefe de gabinete/candidato à sucessão. O auditório da Unitau estava lotado.

Nas primeiras apresentações, aprendi que o Fórum dava continuidade aos cinco microfóruns temáticos que aconteceram em diferentes regiões da cidade (sobre os quais eu também não ouvi falar, mas enfim...). Assisti a um vídeo de propaganda da Prefeitura, exaltando seus feitos. Entre eles, um tema que me toca diretamente, o "posto do Acessa SP". Lembro que em março fiquei feliz quando soube que o posto do Acessa seria transferido da frente da Prefeitura para a Fundart: a aproximação de tecnologia e cultura ainda não andou muito por esses lados. Mas parou por aí: foi transferido e nunca mais funcionou. Desde que o projeto Ubalab foi finalmente contemplado, tenho tentado descobrir por quê. Fica aquele jogo de empurra, e os computadores continuam desligados (em uma cidade litorânea, o efeito disso é óbvio: já devem estar totalmente oxidados por dentro). Ver o "posto do Acessa" como um dos trunfos da prefeitura naquele vídeo me incomodou ainda mais.

Mas resolvi enfrentar as apresentações. Talvez o mais adequado fosse chamar de seminário de políticas de governo em vez de fórum de políticas públicas. "Fórum" costuma descrever eventos mais participativos. O método do evento era o mais tradicional possível: algumas centenas de pessoas sentadas assistindo a três palestrantes em sequência. Ao fim da noite, as assistentes coletavam perguntas feitas por escrito, que seriam lidas pelo mestre-de-cerimônias. Nenhum espaço para participação efetiva ou opiniões críticas. Tudo sob controle. Para mim, isso é o oposto de um fórum.

Eu tinha achado inusual que a palestra sobre Resíduos Sólidos fosse proferida pelo representante da secretaria de Minas e Energia, Dr. Milton Flávio. No fim das contas, se tratava de propor a transformação de lixo em energia "limpa", com tecnologia alemã. Muito pouco sobre reuso, redução, reciclagem e afins. Não fiquei para as perguntas.

No dia seguinte, peguei o fim da apresentação sobre emprego e trabalho, que falava sobre... projetos do governo estadual. A apresentação do turismo trouxe alguns projetos interessantes no litoral como o Caminha São Paulo/Passos dos Jesuítas. Mas uma vez mais, nem sinal de conversa sobre políticas públicas, planejamento ou estratégia. Ele ainda mencionou uma fantástica referência bibliográfica de grande profundidade conceitual: "quem roubou meu queijo".

O email com a programação não dizia quem seria o enviado da Secretaria de Cultura. Mesmo que seguisse a linha de divulgação de políticas de governo em vez de debate de políticas públicas, pelo menos teria a oportunidade de saber mais sobre o que a Secretaria tem feito, e talvez perguntar sobre o Proac e outros programas. Vi que havia alguns produtores culturais da cidade na plateia. Qual a surpresa ao perceber que a produção do evento já chamava os palestrantes anteriores para a sessão de perguntas. Chamei uma das meninas que trabalhava no evento e perguntei: "e a Cultura?". Ela respondeu "a pessoa não veio".

Foi a coroação de um "fórum" realizado sem muita vontade de debater, baseado na bajulação de autoridades e na lógica do "para inglês ver". Grande parte dos palestrantes nem sabia muito bem onde fica Ubatuba (se referiam à região como "aqui na baixada"). Fiquei bastante decepcionado, e ainda mais disposto a pensar em como a tecnologia pode ajudar a construir o fundamental debate sobre qual é a cidade que a gente gostaria de ter. Daqui a algumas semanas eu volto ao tema.